sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Série Grandes Contos Verídicos - parte 3 - VP Animals

Na VP (essa mesma, descrita na parte 2 desta série) tem uma avenida chamada Salim Farah Maluf, nomeada em homenagem ao pai daquele que ceis tão ligado. Ela tem quatro pistas em cada sentido e termina na via Dutra. Por conta disso o movimento é contínuo e ininterrupto durante todas as horas do dia em que o planeta Terra está girando, e formado não só de carros e motos loucaços mas de uns 50% de caminhões, dos quais muitos são de tamanho monstruoso.
To trabalhando na área e agora há pouco fui atravessar essa avenida pra ir almoçar. Farol aberto, eu ali esperando fechar como fazem todos que pretendem seguir existindo. De repente o inesperado: de esguelha avisto, do outro lado da avenida, um poodle branco, coleira, língua de fora, cara de poodle branco bocó felizão, que já começou a atravessar.
A cena é de terror. Logo começam as brecadas bruscas, buzinas, hábeis motoqueiros desviando poucos centímetros antes de espatifar o animal. A passagem de uma jamanta de repente me bloqueia a visão do suicida por alguns momentos. A diferença de tamanho entre animal e jamanta me lembrava aquela entre a Terra e o Sol que a gente vê nos livros do primeiro grau. Ele passa pelo canteiro central e começa a segunda parte da viagem.
Vamos convir que aos motoqueiros podemos atribuir um princípio de conservação: se daria mal também o que atropelasse o bicho, já que perder a estabilidade na Farah Maluf nunca foi ou será boa idéia, mas um piloto de caminhão monstro sequer se daria conta do ocorrido. Portanto, apesar de não ter motivos pra crer que caminhoneiros tenham um furor sanguinário a priore, me impressionou a tentativa de todos eles de evitar a tragédia, seja por consciente amor ao mundo animal ou puro reflexo.
Pois bem. Na segunda parte o horror só aumentou. Muitas brecadas e dava pra ver que a cada pista ultrapassada vinha um sujeito que ainda não avistara o transeunte maluco. Cada vez mais próximo do meu lado da rua, eu já podia avistar a mudança de semblante do animal a cada geringonça que freava na hora agá: um olhar de agonia que logo passado o perigo voltava ao sorrisão. Devo admitir que a essa altura já não tinha mais compaixão pelo bicho mas, ao contrário, o culpava: não se desdenha assim da própria vida; e a cada momento de perigo virava a cabeça temendo como minha mente receberia a imagem de um poodle esmagado por uma dupla roda de carreta.
A última pista. A pior delas. Quase lá. Carreta breca, animal recua e vão passando seus montes de rodas. O bicho é tão retardado que ameaça seguir entre a primeira e segunda fileira de eixos.

Passa. Consegue. Termina a travessia quase roçando na minha perna.

Petrificado, só acompanho com a cabeça o poodle branco, coleira, felizão, seguindo bairro adentro.

4 comentários:

Unknown disse...

esse tá genial hahah

Thierry Boutsen disse...

'C' é de Carolina?

katia abreu disse...

melhor de todos.

ana beatriz disse...

gostei, fazia tempo q não passava por aqui e gostei bastante.